12 janeiro, 2009



Despede-se um gênio

Se por um instante Deus se esquecesse de que sou uma marionete de trapo e me oferecera um pouco de vida, possivelmente não diria tudo o que penso, mas, sem dúvida, pensaria tudo o que digo.
Daria valor às coisas, não pelo que valem, mas pelo que significam.
Dormiria pouco, sonharia mais, porque por cada minuto que fechamos os olhos perdemos sessenta segundos de luz.
Caminharia quando os outros se detivessem, despertaria quando os outros dormissem.
Escutaria quando os outros falassem. E, como desfrutaria de um bom gelado de chocolate!
Se Deus me oferecesse um pouco de vida, vestiria com simplicidade, deitar-me-ia ao sol, expondo não só o meu corpo, mas também a minha alma.
Meu Deus, se eu tivesse um coração, escreveria o meu ódio sobre gelo e esperaria que o sol saísse.
Pintaria com um sonho de Van Gogh sobre as estrelas um poema de Benedetti e uma canção de Serrat seria a serenata que ofereceria à lua.
Regaria com as minhas lágrimas as rosas, para sentir a dor dos seus espinhos e o beijo encarnado das suas pétalas...
Meu Deus, se eu tivesse um pouco de vida... Não deixaria passar um único dia sem dizer às pessoas que amo, que as amo.
Convenceria cada mulher ou homem de que são os meus preferidos e viveria apaixonada pelo amor.
Aos homens provaria quão enganados estão ao pensar que deixam de estar apaixonados quando envelhecem, sem saber que envelhecem quando deixam de apaixonar-se.
A uma criança dar-lhe-ia asas, mas deixaria que ela aprendesse sozinha a voar.
Aos idosos ensinar-lhes-ia que a morte não chega com a velhice, mas sim com o esquecimento.
Tantas coisas aprendi com vocês, os homens...
Aprendi que todos querem viver no cimo da montanha, sem saber que a verdadeira felicidade consiste no modo de subir o escarpado.
Aprendi que quando um recém-nascido aperta, pela primeira vez, com o seu punho pequeno o dedo do seu pai, tem-no preso para sempre.
Aprendi que um homem só tem direito a olhar outro homem como mais baixo, quando tenha que ajudá-lo a levantar-se.
São tantas as coisas que pude aprender convosco, mas, realmente, não me serviram de muito, porque quando me guardarem dentro desta mala, infelizmente, estarei morrendo.
Diz sempre o que sentes e faz o que pensas.
Se eu soubesse que hoje seria a última vez que te veria dormir, abraçar-te-ia fortemente e rezaria ao Senhor para que pudesse ser o guardião da tua alma.
Se eu soubesse que esta seria a última vez que te veria sair por esta porta, dar-te-ia um abraço e um beijo e chamar-te-ia novamente para dar-te mais.
Se eu soubesse que esta seria a última vez que escutaria a tua voz, gravaria cada uma das tuas palavras para poder ouvi-las, uma e outra vez, indefinidamente.
Se eu soubesse que estes seriam os últimos momentos em que te verei, diria: “Amo-te!” e não assumiria, estupidamente, que já o sabes.
Sempre existe um amanhã e a vida nos dá outra oportunidade para fazer as coisas bem, mas, se por acaso me engano e hoje é tudo o que nos resta, gostaria de dizer-te o quanto te amo e que nunca te esquecerei.
Ninguém tem o amanhã assegurado, nem o jovem nem o idoso.
Hoje poderá ser a última vez que vês os que amas. Por isso, não esperes mais... fá-lo hoje, porque o amanhã pode nunca chegar e, então lamentar-te-ás do dia em que não tiveste tempo para um sorriso, um abraço, um beijo... o dia em que estiveste muito ocupado para conceder-lhes um último desejo.
Mantém os que amas perto de ti. Diz-lhes ao ouvido o muito que os necessitas, ama-os e trata-os bem. Arranja tempo para dizer-lhes: “Sinto muito!” “Perdoa-me!” “Por favor!” “Obrigado!” e todas as palavras de amor que conheces.
Ninguém te recordará pelos teus pensamentos secretos. Pede ao Senhor a força e a sabedoria para expressá-los. Demonstra aos teus amigos o quanto são importantes para ti!
GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ

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